segunda-feira, 6 de junho de 2022

A TRANSFORMAÇÃO DIGITAL DOS SINDICATOS É URGENTE

 



Hoje, as vantagens da transformação digital dos sindicatos já são evidentes. As possibilidades de melhoria da comunicação com os sindicalizados e de redução de custos são inúmeras. Mas elas não param aí, e se estendem à qualificação da prestação de serviços e à organização sindical. Bem feita, a transformação digital de um sindicato pode torná-lo uma ferramenta invencível.

Entretanto, o cenário que temos hoje no que diz respeito ao uso das novas tecnologias pelos sindicatos é desolador. Outro dia, olhando a Biblioteca de Anúncios do Facebook, descobri espantado que dois de nossos clientes sindicais estão entre os 11 maiores anunciantes do país no seu segmento na plataforma. Senti um misto de felicidade e profunda preocupação ao mesmo tempo. Felicidade por encontrar uma prova concreta de que nossos esforços junto aos nossos clientes na sua transformação digital estão na vanguarda do setor no país. Preocupação porque, se não houver uma mudança radical nas entidades sindicais brasileiras, elas estão fadadas a desaparecer.

O que é a transformação digital?

Se você der um Google, vai encontrar muitas definições do que seja uma transformação digital. Todas giram em torno à ideia da necessidade de incorporar as mudanças tecnológicas aos processos de uma empresa, uma entidade, um governo… Vale até mesmo no que diz respeito a nossa sociabilidade. Hoje, quem não tiver um perfil nas redes sociais para acompanhar o que se passa com os amigos, e ser acompanhado, é um “dinossauro”.

Encontrei esta definição: “Transformação digital é uma mudança de mentalidade e de cultura nas empresas que têm como objetivo se tornarem mais modernas, não ficarem para trás e acompanharem os avanços tecnológicos que não param de surgir.” É uma das mais simples que o Google fornece na busca, mas serve para nosso propósito. Ela diz que a transformação digital “é uma mudança de mentalidade e de cultura”. Ou seja, é uma mudança que não se limita à comunicação, ou à simples passagem de ferramentas e instrumentos analógicos para os digitais. Estamos vivenciando uma mudança cultural que exige transformações profundas no dia a dia das organizações e do nosso próprio modo de pensar e agir.

Numa das primeiras entidades sindicais que assessorei, fui contratado para fazer um boletim semanal. Na verdade, um panfleto impresso num formato A5, 4 páginas, que era distribuído nas madrugadas, no portão dos locais de trabalho. O boletim informava, organizava, distribuía as palavras de ordem. Junto do corpo a corpo, era a ferramenta fundamental do trabalho sindical. À época, era um trabalho de vanguarda o que realizávamos.

Com esforço, introduzi duas outras dimensões no meu trabalho de assessor de imprensa. Passei a fazer a divulgação das ações do sindicato junto à mídia (rádios, jornais) e a trabalhar a imagem da categoria realizando cobertura fotográfica das atividades sindicais. Meu assessoramento naqueles idos da década de 80 fez sucesso. Realizei uma transformação na comunicação e no marketing do sindicato que o colocou em destaque na região e no Estado.

Quando o passado é obstáculo

Hoje, um trabalho como o que fiz há mais de 40 anos seria absolutamente insuficiente. Entretanto, por todo o Brasil, ainda temos milhares de entidades que estão presas a este formato. São 11.257 entidades sindicais de trabalhadores no país, quase todas atreladas a um passado muitas vezes de conquistas, e que resistem a introduzir mudanças no seu fazer sindical. Veem as novas tecnologias como adversárias de suas atividades (até porque elas de fato são utilizadas pelos patrões com esse viés), e portanto recusam utilizarem-se delas.

Urge que este preconceito seja superado, sabendo que o quê precisa ser feito nem sempre é simples de ser implementado. Cada categoria de trabalhadores possui realidades distintas e as soluções devem se adequar a estas realidades. O primeiro passo, contudo, precisa ser dado.

O que fazer?

Constatado o problema, o que fazer é a pergunta que sempre me fazem. A maioria na verdade não quer mudar nada, quer conservar o que já tem. É natural, o ser humano é conservador. Uma parcela, percebendo que os tempos estão mudando, se dispõe a ouvir respostas a essa pergunta, mas não para mudar de verdade e sim para tentar absorver do novo aquilo que ajude a conservar o velho. Poucas são as categorias que de fato estão realizando a transformação digital de suas entidades. E são essas as que vão ter força no próximo período.

A resposta ao que fazer é simples: decidir por absorver e dominar as novas tecnologias. Decidir por colocá-las a serviço da entidade e da luta sindical. E dar o primeiro passo.

O primeiro passo

Normalmente é aí que as coisas se complicam. Dar o primeiro passo em qual direção? Qual é mesmo o ponto de partida? Qual hardware, qual software, qual estratégia? Qual área modernizar primeiro? A comunicação, os serviços?

Existem pelo menos quatro esferas de atuação de uma entidade em que a transformação digital pode ajudar de maneira muito importante: a melhoria da comunicação, a redução de custos, a melhoria na prestação de serviços e a melhoria na organização sindical. Não da mesma maneira que em um sindicato, mas isso vale também para prefeituras e estados, para entidades associativas em geral, com ou sem fins lucrativos, e organizações políticas.

A comunicação digital

A comunicação digital nos sindicatos é essencial para melhorar a relação das direções com as bases, e das bases com as direções. Até agora os sindicatos que têm se empenhado em fazer a transformação digital de sua comunicação exploram apenas um lado do processo, o do sindicato como emissor de mensagens. Alguns já conseguem avançar no sentido da segmentação e da ampliação da confiança nas suas categorias. Mas pouco existe no sentido de usar as ferramentas digitais para a interação com as bases, essa sim um salto no processo comunicativo de uma entidade.

Uma comunicação digital eficiente exige um site competente e a presença ativa nas redes sociais mais utilizadas pelas bases. É uma tarefa complexa, mutante, desafiadora, que permite estabelecer uma relação de comunicação direta com os sindicalizados e a categoria, sem a mediação dos meios de comunicação tradicionais. Usados de modo inteligente, os ganhos obtidos com os meios digitais são imensos.

Há dez anos, uma reclamação frequente que aparecia nas pesquisas que realizávamos com sindicatos era a da ausência de comunicação. Com a transformação digital que implantamos nas entidades que atendemos, isso deixou de ser um problema para as categorias.

A redução de custos

Com a pandemia, os sindicatos mais atuantes no país rapidamente passaram a se organizar através do digital. Montaram lives, realizaram reuniões e assembleias pelo Zoom, fortaleceram suas redes sociais, seus grupos de WhatsApp. Os sindicatos perceberam que boa parte de seus processos poderia ser realizada digitalmente. A começar pelas eleições sindicais, mas não só.

O uso intensivo do digital na pandemia implicou numa grande economia de custos inerentes às atividades presenciais. Grande parcela destas atividades presenciais (as eleições, por exemplo) não tem porque voltarem a ser realizadas presencialmente.

Serviços eficientes

Se isso é válido para grandes atividades, a possibilidade de economia e melhoria da performance do sindicato existe também nas pequenas questões. Vamos pensar num trabalhador que tem interesse em utilizar a colônia de férias do sindicato. Na ampla maioria das entidades, o sindicalizado precisa comparecer ao sindicato, com documentos e prova de que está em dia com a tesouraria, para fazer uma reserva. Em geral, só algum tempo depois recebe uma confirmação desta reserva.

O sindicalizado gastou na reunião dos documentos, no seu deslocamento, investiu tempo para realizar a reserva. O sindicato gastou a energia de seu funcionário ou dirigente que realizou o atendimento, conferiu documentos, anotou a reserva e depois informou da confirmação. O funcionário ou dirigente pode ter seu trabalho muito melhor aproveitado em atividades sindicais. E o associado pode ter os custos pessoais com a reserva eliminados facilmente. Neste caso, soluções digitais trazem muitas vantagens para o sindicalizado, que deseja ter um atendimento eficiente e barato, e para a entidade. O mesmo vale para todos os outros serviços, como jurídico, convênios etc.

Organização sindical

O movimento sindical não despertou ainda para o enorme potencial de organização sindical permitido pelas novas tecnologias digitais. Na política já temos diversas experiências, algumas muito bem-sucedidas, mas no terreno sindical brasileiro não existe nada até agora.

Nos anos de 1970, em plena ditadura, o Movimento de Oposição Sindical Metalúrgica de São Paulo (OSM-SP) organizava Comissões de Fábrica clandestinas em quase todas as grandes empresas da capital paulista. A comunicação entre os membros das Comissões era lenta, realizada corpo a corpo, por necessidade cercada de rigores de segurança muito grandes.

Hoje, através de canais digitais é possível erguer e manter todo e qualquer tipo de organização. Desde a organização clandestina, até a organização aberta e transparente, envolvendo toda uma categoria de trabalhadores.

Se naquela época, a formação de um dirigente sindical passava por dominar alguma oratória e o desafio de falar em público, hoje a formação de um sindicalista competente passa por dominar as ferramentas digitais e colocá-las a serviço das lutas. Para fazer isso, urge investir na transformação digital.