terça-feira, 27 de julho de 2021

Breve roteiro do desenvolvimento do marketing eleitoral digital


 Onde tudo começou 

Breve roteiro do desenvolvimento do marketing eleitoral digital


Por Paulo Cezar da Rosa (*)


Ainda que tenham  ocorrido antes outras campanhas digitais, ou tentativas delas, a primeira campanha digital de fato foi a de Barack Obama em 2008. A campanha de Obama tinha uma lógica de uso das plataformas digitais, principalmente do Facebook, com a criação de grupos regionais e temáticos, mas o central era uma página-site (uma landing page) onde para entrar, para ter acesso aos conteúdos, você tinha que deixar o e-mail. Ou seja, já havia a compreensão de que para manter um relacionamento era essencial ter acesso aos dados da pessoa. 


O e-mail marketing foi uma ferramenta central em 2008. Neste período, as redes sociais ainda estavam em construção e as ferramentas que todos usavam eram o e-mail e os motores de busca. Obtendo o e-mail, a campanha pode estabelecer uma relação com os seguidores de Obama. Os e-mails, assinados em geral por assessores diretos do candidato, eram usados para informar e engajar os apoiadores. Estabelecido o contato, a campanha pedia mais dados, entre eles o endereço para envio de materiais e promoção de atividades nas regiões. 


O site chegou a ter mais de 6 milhões de inscritos, e os apoiadores conectados foram sempre os primeiros a saber das iniciativas e do andamento da campanha.  Num quadro já de crise e dificuldades na economia americana, a campanha Obama de 2008 foi articulada com uma narrativa de esperança. A onda Obama mobilizou e entusiasmou muita gente. Vale assistir o discurso de posse: https://www.youtube.com/watch?v=b40F_hn9-KQ . Vale também saber que pela internet os apoiadores já haviam recebido antes do evento uma mensagem de agradecimento com este teor, assinada por Obama. 


Primeira onda: Obama 2012, 5 Estrelas, Podemos


A vitória de Obama em 2008 desencadeou um giro da política ao uso da internet nas  disputas no mundo inteiro. Foi o começo do que podemos caracterizar como primeira onda das campanhas digitais. Obama fez da internet o motor gerador de sua eleição. As ações de marketing, os discursos e as palavras de ordem apareceram primeiro nas redes para só depois se desenvolverem na velha mídia. A TV, que até então, desde a década de 50, era o coração das campanhas, perdeu o seu posto. 


Na esteira de Obama, dois outros movimentos, com contornos políticos bastante distintos, foram bem sucedidos ao utilizar grosso modo a mesma lógica digital. Na Espanha surgiu o Podemos e na Itália o Movimento 5 Estrelas. 


O M5S surgiu na Itália em 2009 definindo-se como um não partido. Liderado por um comediante chamado Beppe Grillo, o 5 Estrelas se propunha a colocar cidadãos comuns no poder e estabelecer uma democracia direta através do uso da Internet. Usando as redes, o M5S cresceu rapidamente, elegendo diversos presidentes de câmara, além de vários parlamentares em nível municipal e regional. Em 2013, o M5S conquistou 26% da Câmara de Deputados e 24% do Senado, e continuou a crescer nos anos seguintes. 


O Podemos participou nas eleições europeias de 2014, quatro meses depois da sua formação. Em menos de uma semana, surpreendeu o mundo político espanhol, tornando-se o partido mais seguido nas redes sociais, superando a direita (PP) e a centro-esquerda (PSOE). O Podemos conquistou cinco cadeiras (de um total de 54), com 7,98% dos votos, sendo a quarta candidatura mais votada em Espanha. Toda a sua organização se deu apoiada nas redes sociais. Da filiação à participação político-eleitoral. 


A lógica destas campanhas e movimentos foi a de potencializar politicamente a sociabilidade permitida pelas redes sociais e crescer no ambiente de profundo desgaste da velha política ofertando uma alternativa “nova”. Tanto o 5 Estrelas quanto o Podemos cresceram muito e têm muita força eleitoral ainda hoje. No que diz respeito à relação político-digital, são organizações políticas com base na ideia de aderência, de entregar para o movimento o seu endereço de e-mail e a partir disso desenvolver uma relação política e militante. 


Segunda onda: Brexit 2014, Trump, Colômbia


A segunda onda de campanhas digitais vai ter outros componentes. Ainda que tenham ocorrido experiências similares anteriores, a primeira, ou mais importante, é a do Brexit, na Inglaterra, em 2014. Na sequência virá a eleição de Trump em 2016 e também a campanha que derrubou o acordo de paz na Colômbia. Essas campanhas foram muito diferentes do que haviam sido as de Barack Obama, do Movimento 5 Estrelas e do Podemos. O marketing digital passa a trabalhar com um conjunto de ferramentas desenvolvidas para a manipulação dos cenários, vai usar os algoritmos para conduzir o voto e alterar o comportamento das pessoas.   


No Brexit, por exemplo, havia cerca de 7 milhões de eleitores que normalmente não iriam às urnas. Seu comportamento tradicional era abstencionista. Utilizando as redes, a campanha pelo Brexit conseguiu que 4 destes 7 milhões fossem às urnas votar pela saída da Inglaterra do mercado comum europeu, alterando o resultado final. Estas pessoas foram incentivadas por ações dirigidas, que exploravam suas frustrações e temores, seus ódios e rancores. 


O marketing de Trump em 2016 soube igualmente explorar esses sentimentos. Mas foi muito além. Trump usou largamente as fake news, as teorias de conspiração e a linguagem do “tio do almoço de domingo”. Hillary Clinton era abertamente chamada de ladra. Até de manter e explorar sexualmente escravas brancas no porão de uma pizzaria, Hillary foi acusada. . 


Trump teve setores da mídia tradicional atuando em sua defesa, mas a maioria dos grandes meios de comunicação apoiou a candidata democrata. Prometendo uma América Grande de Novo, Trump venceu as resistências primeiro dentro do seu partido e depois em estados decisivos. Mesmo tendo tido menor número de votos, conseguiu maioria no colégio eleitoral. Contribuiu decisivamente para isso o microtargeting, o direcionamento das mensagens para 32 perfis psicológicos diferentes, o uso intensivo de fake news e o incentivo ao ódio. 


Na Inglaterra, o marketing digital da campanha foi desenvolvido pela Cambridge Analytica, uma empresa criada por Robert Mercer e Steve Bannon. Mercer era desenvolvedor da IBM nos anos 90. Saiu da IBM e aplicou seus conhecimentos na manipulação dos algoritmos no mercado financeiro. A partir de 2008, quando veio a crise e acabou a festa para muitos neste mercado, passou a investir na ultradireita visando a ampliação da fronteira de exploração da humanidade através da destruição dos direitos sociais conquistados no pós Segunda Guerra Mundial. 


A Colômbia, em 2016, depois de 50 anos de atuação das FARC e 4 anos de negociação entre o governo e a guerrilha, estava chegando a um acordo de paz que poderia afirmar um caminho democrático para o país. Este acordo, entretanto, não era desejado pela ultradireita do ex-presidente Álvaro Uribe. Na Colômbia, a manipulação da religião, em especial do voto evangélico, obteve sucesso. Muitos consideraram o papel dos pastores, a manipulação dos preconceitos de gênero, o uso aberto da religiosidade do povo, decisivo para obter um resultado apertado, mas que dividiu ao meio o país. 


Terceira onda: Bolsonaro 2018 …. 


A terceira onda das campanhas digitais é o que nós conhecemos no Brasil em 2018. É uma campanha que merece o status de terceira onda porque ela não traz apenas a afirmação do novo marketing digital desenvolvido a partir do Brexit. A campanha Bolsonaro em 2018 combina o velho e o novo marketing de uma maneira radical. 


No Brasil, as redes sociais foram parar na mão das pessoas. Com 98% de penetração, a internet móvel e o acesso irrestrito, sem custos adicionais, às redes sociais, tornaram o brasileiro um alvo fácil. As mãos dos eleitores viraram parque de diversões para o marketing digital bolsonarista. 


Somada a essa facilidade tecnológica, diferente do que houve na Inglaterra e na eleição norte-americana, onde a classe dominante se dividiu entre duas opções, a campanha do candidato da ultradireita, Jair Bolsonaro, vai expressar uma forte e unida frente única de todos os setores da classe dominante. Isso vai se dar primeiro pelo impeachment, por motivos estritamente políticos, da Presidente Dilma Roussef, e logo em seguinda pela defesa incondicional da candidatura do ex-capitão do Exército, quando ficou evidente que, mesmo retirando o ex-presidente Lula da disputa, somente Bolsonaro poderia vencer o PT.  


Em parte pela situação particular do Brasil, a campanha digital da ultradireita vai se articular com o marketing de guerra das FFAAs, com a propaganda permanente dos meios de comunicação de massas, principalmente do sistema Globo, com a ação política do Poder Judiciário, através da Operação Lava Jato, com o enfraquecimento e destruição de empresas e setores da economia apoiadores do projeto lulista, com a atuação política e econômica de amplos setores empresariais de ultradireita, com a atuação das milícias, em  especial no Rio de Janeiro, e a adoção de soluções de marketing tradicional radicais. Tudo isso tendo por detrás a ação hoje já comprovada dos EUA na sua organização e promoção.  


Num primeiro momento, a ação dos meios de comunicação, do judiciário e mesmo dos EUA, não pretendia instalar no poder a família Bolsonaro. O objetivo era claramente colocar na presidência um candidato de direita, preferencialmente oriundo do PSDB. Bolsonaro, entretanto, no embalo da onda internacional de crescimento da ultradireita, usando com agressividade o marketing digital, suplantou todos seus adversários da direita e do centro, se posicionando como alternativa a Fernando Haddad, que substituiu Lula no seu impedimento.  


O que tornou isso possível para Bolsonaro foi o surgimento das redes sociais e o uso intensivo do microtargeting, da manipulação dos algoritmos, das fake news. Com as redes, a ultradireita, que desde a redemocratização estava circunscrita aos churrascos de domingo e representações secundárias, encontrou no “mau militar” um agitador e porta-voz nacional. A direita, derrotada pelo lulismo em 2002, 2006, 2010 e 2014, foi rapidamente substituída no cenário político-eleitoral de 2018 pela ultradireita.


O uso intensivo da comunicação digital permitiu à campanha bolsonarista  tornar-se viável, mas mesmo assim não foi apenas com base na internet que ela conquistou maioria dos votos válidos no segundo turno. Contribuiu decisivamente para isto a realização de uma operação de marketing clássica na política brasileira: a transformação do candidato em vítima. 


A vitimização é um recurso eleitoral recorrente em eleições. A campanha de Bolsonaro utilizou-o de maneira radical, diferente de José Serra, por exemplo, que posou de vítima de uma bolinha de papel. Independente da veracidade ou não do ato, o que importa do ponto de vista do marketing é que Bolsonaro, aos olhos do país, foi vítima de uma facada justamente no momento em que sua campanha mostrava crescimento e capacidade de enfrentar o candidato do PT no segundo turno. 


O episódio da facada ocorreu no dia 06 de setembro, um mês antes do primeiro turno das eleições, dia 07 de outubro. Com isso, Bolsonaro, que tinha pouco tempo de TV, inundou as TVs, rádios e jornais de todo o país todos os dias e em todos os horários. Enquanto seus adversários ficaram restritos ao uso dos horários eleitorais oficiais, toda a mídia divulgava o nome e a candidatura do ex-capitão em todos os seus espaços noticiosos e de opinião. Assim, ainda que tenha conquistado um grande número de apoiadores através do marketing digital,  Bolsonaro só ganhou amplitude com o apoio da velha mídia. Na internet, o bolsonarismo se posicionou como alternativa e organizou sua base de apoio militante. A conquista da maioria se deu com o uso bastante inteligente do marketing tradicional e da vitimização fora dos espaços oficiais de campanha. 


Onde tudo acaba: O futuro já começou


O uso da TV na política teve início em 1952, com uma campanha publicitária que elegeu o general Dwight Eisenhower nos Estados Unidos. Prometendo uma cruzada contra o "comunismo, Coreia e corrupção”, o general foi eleito com facilidade, surpreendendo os Democratas que entraram no pleito com os seus velhos métodos e certos da vitória. 


A esquerda em todo o mundo levou mais de 30 anos para começar a reagir ao marketing televisivo. Acredito que já em 2022 é possível enfrentar o marketing digital da ultradireita. Mas, para fazer isso com eficiência, a esquerda não pode se confundir nem vacilar. 


Hoje podemos dizer que a sociedade brasileira já integrou a camada tecnológica da internet e das redes sociais em suas atividades, inclusive na dimensão política. O celular é ferramenta de trabalho, de comunicação, de entretenimento e também de participação política. Isso, claro, com todas as desigualdades que o país sofre e com agudos reflexos no terreno digital. 


Neste momento, não é certo sequer que Bolsonaro será um nome na urna em 2022. Mas mesmo que não participe diretamente da disputa, nas próximas eleições as técnicas de marketing do bolsonarismo estarão presentes e precisarão ser enfrentadas. 


Partimos da ideia de que o deslumbramento inicial com as redes sociais já está se dissipando. Que o povo brasileiro já se “vacinou” ou está se vacinando com relação ao marketing digital, às fake news etc. Partimos também da ideia de que é preciso combinar o velho e novo, ou seja, os velhos modos de fazer campanhas e os novos modos trazidos pela era digital e pelas redes sociais. Além disso, no terreno digital, é preciso ter em conta que tudo hoje é mobile. A mensagem precisa ser adaptada a cada um dos canais, mas sempre tendo em vista o celular na palma da mão das pessoas.  


De outro lado, a primeira coisa a ser descartada é tentar copiar os adversários. A ultradireita não tem nada a nos ensinar. Ao contrário, ao dissecarmos o marketing da ultradireita, tudo o que vamos encontrar é manipulação, mentira e autoritarismo. Não existe nada de bom no marketing da ultradireita, mas é provável que muitos busquem utilizá-lo para tentar ocupar espaços em 2022. Afinal, este marketing fez sucesso em 2018 e hoje há dezenas de empresas de marketing ofertando as suas soluções. 


Independentemente do desfecho do governo, a terceira onda da comunicação digital preparou o que está por vir no ano que vem, quando teremos uma guerra no terreno digital (e fora dele)….  Hoje, o bolsonarismo tenta uma radicalização ainda maior de seu marketing e já dá sinais de que pretende fazer das eleições cenário para um golpe de Estado, rompendo frontalmente com a legalidade. Os episódios recentes,  do “soluço” do presidente buscando reativar o vitimismo, aos constantes ataques à democracia e às urnas eletrônicas, se enquadram neste objetivo. 


Em “Fora da ordem” Caetano Veloso tem um verso muito expressivo com relação ao Brasil. Ele diz “aqui tudo parece que ainda é construção e já é ruína”. Este parece estar sendo o caso do Bolsonarismo. Tendo perdido apoio de parte da mídia, de um setor importante do Judiciário, de setores do empresariado, mas mantendo ainda o respaldo do Partido Militar (das FFAAs, que têm estado por detrás de tudo no Brasil desde o golpe que instaurou a República), Bolsonaro é um governo que até meados de 2020 parecia estar em construção. Hoje, em meados de 2021, já está se transformando em ruínas.  


Em oposição, o campo em torno de Lula precisa apresentar a sua própria combinação do velho e do novo em termos de marketing. E também entender que o momento é totalmente diferente dos primeiros 15 anos deste século. Até 2014, o marketing paz e amor deu conta de boa parte dos problemas. Hoje, ele é insuficiente. Além de uma mensagem de esperança, será preciso demonstrar ter força e determinação. 


Até o momento, Lula parece estar se beneficiando não só do seu passado, mas principalmente do presente desastroso do seu maior adversário. Se a eleição fosse hoje, estaria eleito. Mas Lula não pode se postar  apenas como o que já foi; precisa dizer o que pretende ser, apresentar um projeto de futuro capaz de encantar amplos setores da sociedade. 


Se em 2002 foi suficiente o marketing “paz e amor”, hoje a fórmula mais adequada pode ser “trabalho e sonho” para construir um Brasil com a grandeza e importância que temos na América e no mundo. 


Muito trabalho e sonho, porque uma coisa é certa: O futuro já começou! 


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(*). Jornalista e publicitário. Diretor da Veraz Comunicação e da Red Marketing, empresas sediadas em Porto Alegre. 


sexta-feira, 19 de março de 2021

A PUBLICIDADE PERDIDA


Tenho ficado assustado com os rumos da publicidade ultimamente. A meu ver, a publicidade brasileira, que teve grande protagonismo em nível mundial desde os anos 80 do século passado até os anos 2010, está perdida.

Não se trata de falta de técnica, ou de sofisticação, ou mesmo de racionalidade custo-benefício dos investimentos. Se trata de falta de ética. A publicidade brasileira, assim como o país, perdeu-se em termos de caráter.

Vou referir aqui, como exemplos da falta de ética da publicidade, algumas campanhas que você já deve ter visto. Uma é a campanha de alistamento às FFAA, paga pelo Ministério da Aeronáutica. Outra é uma campanha recente do MEC que divulga a existência de uma cartilha de orientação às crianças na volta às aulas. Por fim, vou tratar de um anunciante do setor privado.

Propaganda de Guerra

A campanha do alistamento militar, extremamente ostensiva, ultrapassa em muito os objetivos anunciados na peça, ou seja, o de fazer com que jovens que estão fazendo 18 anos compareçam numa unidade de recrutamento ou usem o seu celular para alistarem-se. A campanha parece buscar na verdade querer comprar proteção às FFAA junto aos meios de comunicação, de um lado, e potencializar uma imagem positiva e a sua presença diária junto à sociedade, de outro. (Ver aqui: https://www.youtube.com/watch?v=v4F6aknZzsE ).

Na lógica da propaganda de guerra desencadeada pelas FFAA, em especial, e pelas forças que elegeram Bolsonaro, a campanha publicitária em curso neste momento se enquadra na linha de “propaganda cinza”, ou seja, aquela que se dirige ao setor intermediário da zona de conflito e busca atraí-lo para um dos lados. O público-alvo, no caso, é o povo brasileiro.

A publicidade brasileira nunca foi muito rigorosa em relação a sua “linha criativa”. Diante de qualquer aceno de um cliente poderoso, desdobrou-se em mesuras e genuflexões. Quando Lula chegou ao poder, no dia seguinte as grandes agências que haviam torcido e atuado contra o ex-metalúrgico falavam em solidariedade, justiça social e direitos em sua linguagem publicitária. Hoje, entretanto, não é só disso que se trata. Não é mais uma tentativa de aproximação com um novo cliente no mercado. O que as grandes agências estão fazendo é trabalhar conscientemente por um projeto autoritário, construindo a sua defesa nos mínimos detalhes.

A volta dos que não foram

O comercial do alistamento militar fala por si só. Ele é simpático, mostra as FFAA como um ambiente agradável. Nada perto da imagem do recruta sendo "disciplinado”. Ou seja, é um comercial que também - e até principalmente- fala pra fora, fala para a sociedade brasileira tentando dizer: “olha, nós do Exército, Marinha e Aeronáutica somos caras legais, somos o alicerce da nação”. A ideia que a peça publicitária passa é a de projetar as FFAA como dirigentes da Nação. O que de fato está acontecendo, seja através do “mau militar” na presidência, seja através do vice Hamilton Mourão, ou dos milhares de militares colocados em postos chaves no governo.

Pode dar errado? Claro que pode. Mas o objetivo da peça publicitária é este: construir uma imagem positiva das FFAA e abrir espaço na sociedade para a ideia de que as FFAA devem “mandar em tudo”. Além disso, pelo volume de investimentos aplicados, atrair os veículos tradicionais e a opinião pública para esta estratégia ou, pelo menos, para uma posição de neutralidade.

Tem nexo? Infelizmente tem.

A responsabilização do indivíduo

Outra abordagem muito usada pela publicidade nos últimos anos é a da responsabilização do indivíduo pelos próprios resultados. Assim, se você está desempregado, a culpa é sua. Com certeza, você não foi competente o suficiente. Quer um novo emprego? Esqueça! Torne-se um empreendedor. É uma narrativa presente não só na publicidade, mas também nos meios de comunicação, nos cultos, nas igrejas, enfim, em toda a sociedade.

Esta ideologia, trazida para o ambiente de crise e de pandemia, gerou peças publicitárias em 2020 que, vistas hoje, parecem loucura. Um exemplo é uma campanha do Bradesco ( ver aqui: https://www.youtube.com/watch?v=qxSRpW1kk-s ) ( e aqui: https://www.youtube.com/watch?v=CIytl3hlOzs ) do primeiro semestre do ano passado. A campanha é uma versão publicitária competente do discurso do presidente Bolsonaro sobre a pandemia, e joga sobre os ombros dos indivíduos a responsabilidade por resistir e se reinventar.

Outro exemplo, ainda mais emblemático, é um comercial do MEC (aqui: https://www.youtube.com/watch?v=rxfIhlFNicA ). A propaganda divulga um Guia de Implementação de Protocolos de Retorno às Atividades Presenciais nas Escolas de Educação Básica. Durante um minuto, o MEC e o governo federal ficam estabelecendo regras do que Luana (a estudante do ensino básico) deve fazer para ficar segura. Causa espanto o CONAR não ter interferido para impedir a divulgação da peça. Ela é criminosa. Coloca nos ombros das crianças a responsabilidade de enfrentar o Coronavírus.

O que fazer

É muito pouco o que podemos fazer a respeito, mas buscar uma conscientização do que se passa pode ser um primeiro passo para construirmos uma crítica consistente a estes descaminhos éticos da criação publicitária brasileira. Houve um tempo em que a publicidade, ainda que seja um negócio e como tal visasse o lucro, buscava se inspirar em valores positivos. Compromisso com a verdade, defesa da liberdade, respeito à democracia, defesa da vida, da solidariedade, do humanismo embalavam uma escola criativa que vendia e encantava os consumidores. Havia ética na publicidade.

Hoje, podemos até nos enganar e nos deixar emocionar durante um tempo diante de peças como essa, do Bradesco (aqui https://www.youtube.com/watch?v=xlbnfU3bpJ0 ), mas apenas para, depois de alguns minutos de distanciamento e reflexão chegarmos à conclusão de que a propaganda natalina do banco que mais teve lucros na pandemia, de fato, por trás do discurso da esperança, divulga a naturalização das mortes pela COVID-19. É como se viesse nos dizer: Afinal, “todos nós vamos morrer um dia”, não é verdade? ///

* Paulo Cezar da Rosa, jornalista e publicitário, diretor da Veraz Comunicação.

terça-feira, 16 de março de 2021


Um ano de luta pela vida


No dia 16 de março de 2020 iniciamos o home office na Veraz. Hoje completamos um ano.  

Há um ano, avaliamos que a pandemia era grave e poderíamos ficar 3 ou 4 meses em casa. Erramos feio na segunda projeção. Hoje é provável que ainda fiquemos pelo menos mais seis meses trabalhando em casa. E alguns de nós já nem querem voltar ao formato de trabalho antigo. 

Sim. Tivemos de nos reinventar. E conseguimos. Tivemos de trabalhar dobrado às vezes para atender dentro do nosso padrão de qualidade. Aceleramos muito o giro digital da agência e dos nossos clientes. Conseguimos vencer os desafios um a um. 

O maior desafio de todos ainda precisa de nossa atenção. Até agora, um ano de isolamento, não tivemos nenhuma perda, nenhuma contaminação. Defender a vida é o que nos faz humanos. 

Vamos em frente! Vamos vencer!


 

segunda-feira, 1 de março de 2021

CLIENTE: PREFEITURA DE RIO GRANDE. CAMPANHA: IPTU 2021

 Estas são algumas peças da campanha que estamos fazendo ap longo deste mês de março para a Prefeitura de Rio Grande. Campanha online e offline. Rádio, TV, portais da internet, redes sociais. Curte aí: 











quarta-feira, 20 de janeiro de 2021

TENDÊNCIAS DO MARKETING PÓS-PANDEMIA

Nos últimos meses, estamos assistindo diariamente mudanças no marketing. Há poucos dias, por exemplo, ocorreu algo que antes parecia impensável. As Big Techs baniram Donald Trump e seus principais seguidores de suas redes.

Junto destas novidades, temos os processos que já vinham se acumulando e a pandemia acelerou. O digital e as redes estão transformando radicalmente o mundo, tornando-o global, online, explosivo, surpreendente. Novos hábitos vieram para ficar, novas formas de sociabilidade, de trabalho, de contato. Novas maneiras de comunicar e fazer publicidade. Novas maneiras de ver e viver o mundo.

Tudo está mudando ao mesmo tempo na montanha-russa dos acontecimentos. Neste artigo, elencamos algumas tendências para 2021. Nosso objetivo é tentar ampliar nosso entendimento do mundo que temos nas mãos.


Mistura do físico e do digital

Uma tendência irreversível é a integração da loja física com a digital, da ação direta com a realizada nas redes. Com a pandemia, cresceu enormemente o comércio digital, mas não só isso. Cresceu também a mistura do digital com o real. Vendedores começaram a fazer lives de dentro das lojas, apresentando os produtos. Consumidores em suas pesquisas já não sabem mais quando estão olhando um catálogo ou estão dentro da própria loja física, conversando com um chatbot ou com um vendedor de carne e osso.

Essa mistura do digital e do físico vem se realizando em todas as dimensões da vida. Do app de namoro às campanhas eleitorais, onde as mais bem-sucedidas foram as que integraram de forma inteligente as campanhas presenciais com a propaganda e interação nas redes sociais.


A monetização se impõe

Norte-americanos são especialistas em trabalhar com amostras grátis. Quem já viu filmes de bang-bang certamente se lembra de ver os caixeiros viajantes carregando maletas enormes cheias de amostras de algum produto. Estes profissionais nunca foram importantes na luta entre os mocinhos e os bandidos, mas sem eles não teria sido construído o mercado de consumo de massas nos EUA.

As redes lançaram-se apoiadas numa política de amostra grátis. O Google nos deu um e-mail e um sistema de busca grátis, o Facebook nos deu um perfil, um espaço para nos manifestarmos do modo que quiséssemos, o YouTube nos deu um canal de vídeos e até ensina a como ganhar dinheiro com eles… Mas este tempo acabou.

É chegada a hora do social ads e do marketing digital pago. Neste mês de janeiro, até o Telegram anunciou o início do processo de monetização do mensageiro russo. O Telegram é um dos poucos aplicativos que ainda é grátis.

Isso já existia antes da COVID-19, mas agora é regra. No mundo pós-pandemia, quem quiser se comunicar nas redes vai ter de pagar. Há cinco ou dez anos, você postava alguma coisa no Facebook, no YouTube ou no Twitter e praticamente 100% dos seus amigos ou seguidores ficavam sabendo daquela postagem. A comunicação era fácil e praticamente grátis.

Agora, que estas redes já têm todas as informações que precisavam sobre nós, tudo isto está rapidamente se tornando passado. O Facebook distribui uma mensagem para não mais do que 6% dos seus curtidores. Quer atingir mais gente, tem de pagar. Mesmo os perfis pessoais sofrem este tipo de restrição. Os algoritmos privilegiam as fofocas, os assuntos pueris, as fotos de gatinhos e restringem assuntos “sérios”, como temas políticos e outros.

Por isso, uma regra irreversível da pós-pandemia é o marketing digital e o social-ads, ou seja, a publicidade paga na internet e nas redes sociais.


O aprendizado dos algoritmos

Uma das consequências da humanidade ter ampliado o número de horas que passou em frente à tela de um computador ou celular em 2020, é a sua alfabetização em relação aos algoritmos. Esta é uma tendência ainda em construção, mas ela já se apresenta em diversos setores. As pessoas começaram a se dar conta de que quando fazem uma pesquisa na rede, logo em seguida aparece alguma propaganda relativa ao tema pesquisado, ou quando um tema, como armamento por exemplo, ganha espaço, logo aparecem filmes de tiro ao alvo e afins nas suas timelines.

Ou seja, as pessoas reais começaram a entender como funcionam os algoritmos das redes e muitas começaram a interagir com essa “inteligência artificial”. Pensemos no que foi o rádio e a TV. Nos seus primórdios, a relação das pessoas com estes meios era de puro encantamento. Com os anos, as pessoas construíram um senso crítico e passaram a não acreditar em tudo o que viam ou ouviam. O mesmo está em curso agora, com o digital.


Cerco às fakenews

Não sou dos que veem o banimento da ultradireita das redes como uma reação ao autoritarismo. As Big Techs apoiaram Trump em 2016. O Facebook chegou a colocar funcionários seus, especialistas em algoritmos e no direcionamento de mensagens, para trabalhar na campanha do homem laranja. Todas as redes incentivaram e potencializaram a imensa campanha de mentiras e ódio desencadeada em nível mundial, levando ao Brexit, à eleição de Trump em 2016 e de Bolsonaro em 2018. E ganharam muito dinheiro com isso.

Antes de ser política, a decisão ocorre por um motivo econômico. Esta atitude trará profundas alterações na política mundial, mas não só nela. Iniciativas como o Sleeping Giants e outras vêm retirando fortunas dos cofres do Google, Facebook, Youtube, Twitter etc. Trump, com seu marketing de ódio e fakenews, estava dando prejuízo, fazendo mal aos negócios. Continuar apoiando a ultradireita vinha se tornando inviável e economicamente prejudicial às empresas.

A maior mudança de marketing para 2021 é o cerco às fakenews e às mensagens de ódio. Esta alteração trará profundas consequências para todos que atuam nas redes. Para as marcas, para as empresas, para os órgãos de comunicação, para os formadores de opinião, influenciadores e celebridades. Especialmente os políticos serão vigiados daqui para a frente a este respeito, e precisarão desenvolver um cuidado redobrado em sua atuação digital.


Publicidade sustentável

Além do cerco às políticas de promoção do ódio e disseminação de mentiras, é bastante provável que esta tendência se desdobre em combate também ao negacionismo, aos centros de disseminação de teorias da conspiração e negação do aquecimento global. Aliás, uma das tendências de 2021 (que já vinha se manifestando antes da pandemia ) é a adoção de uma linha de publicidade sustentável pelas grandes marcas.

Consumidores de todo o planeta começaram a olhar quem investe em publicidade em blogs e portais que apoiam as queimadas no Brasil, por exemplo, e a recusar estas marcas. O compromisso com o desenvolvimento sustentável passou a ser tão importante quanto o combate à exploração do trabalho infantil.

Marcas, empresas, governos e políticos que não apresentam este compromisso têm perdido espaço ano a ano. A pandemia veio acelerar esta tendência e ela se tornou incontornável.


Pautas sociais e identitárias

Para o marketing, em especial nas redes sociais, onde é possível realizar o microtargeting com grande grau de assertividade, tem importância crescente a integração com as pautas sociais e identitárias. Questões de gênero, raciais, étnicas, sexuais etc precisam da atenção do marketing que queira dialogar com estes nichos ou, pelo menos, não ser rechaçado por eles.

As questões sociais também constituem uma tendência do próximo período. Temas como saúde, educação, segurança e direitos humanos, por exemplo, dependendo da mensagem principal que se queira transmitir, são essenciais na construção de uma estratégia de marketing.


A explosão dos formatos

Conteúdo nas redes daqui para frente é tudo. E como o digital é totalmente maleável, todos os formatos estão explodindo e se integrando. Forma e conteúdo. Entretenimento e publicidade. Relacionamento e serviços. Informação e propaganda.

As fronteiras antes bastante delimitadas, agora quase não existem. Até algum tempo atrás, ao vermos um filme ou um noticiário até podíamos estar sendo alvo de uma ação publicitária oculta, mas a regra era limitar o filme ao entretenimento e o noticiário à informação e vendê-los como tal. Agora essas fronteiras não existem mais. Tudo é conteúdo e tudo é propaganda ao mesmo tempo, e os formatos existem somente como suporte da comunicação e dos objetivos de marketing.

Textos, filmes, podcasts, lives, tuítes, tiktoks… Se antes, ao explicar o fenômeno da TV, Marshall McLuhan cunhou a frase de que o meio era a mensagem, agora podemos dizer que a rede é a mensagem. E para estar presente na vida das pessoas, dependendo do objetivo de marketing, é preciso estar em todas as redes, usando todos os formatos, trabalhando todos os conteúdos. Foco, maleabilidade, múltiplos formatos. Só assim, você vai atingir as metas.